As apresentações dos resultados financeiros do segundo trimestre deste ano de grandes grupos de rádio americanos – como iHeartMedia, Beasley Media Group, MediaCo e Townsquare Media – evidenciaram a importância crescente das receitas do digital para as empresas do setor e também servem como referência de mecanismos de monetização para as rádios brasileiras, como exemplificado ao final deste artigo.
A iHeartMedia relatou um aumento de 13% na receita de áudio digital, impulsionada por um crescimento de 28% nos podcasts, enquanto as vendas de anúncios no rádio AM/FM sofreram quedas. De forma semelhante, a MediaCo registrou um aumento substancial na receita do segundo trimestre, atribuído ao forte crescimento digital e de streaming, o que melhorou significativamente suas perdas líquidas anuais. O Beasley Media Group anunciou que está adotando uma estratégia “digital-first” para garantir a sobrevivência e o crescimento em meio à queda da publicidade tradicional. A Townsquare segue o mesmo caminho de priorizar o digital, que já responde por mais da metade da receita total da companhia.
Em comum, estas empresas atribuem o sucesso financeiro à estratégia de priorizar plataformas digitais e inovações como podcasting e tecnologias de publicidade.
Este movimento tem sido evidente em todo o setor, onde os ganhos digitais estão ajudando a estabilizar a receita geral da indústria. Em 2022, o digital representava 19% dos gastos com publicidade no rádio local americano, e a projeção é que esse percentual suba para 25,1% até o final de 2025.
iHeartMedia: o impulso do áudio digital e programático
A iHeartMedia é líder no setor de áudio e mídia nos EUA, com um portfólio diversificado que inclui a propriedade e operação de mais de 870 estações de rádio AM/FM em cerca de 150–160 mercados, além da plataforma digital iHeartRadio para streaming de música e podcasts. A empresa atua também na produção e distribuição de podcasts, publicidade áudio-digital, eventos ao vivo, como shows da marca iHeart, e oferece soluções baseadas em dados para anunciantes. Seu portfólio abrange uma ampla variedade de formatos, incluindo CHR/Top 40, Country, Adult Contemporary, Classic Rock/Classic Hits, Alternative, Urban/Hip-Hop, News/Talk, Sports, formatos em espanhol/regional-mexicano e dezenas de estações de nicho e canais digitais.
A iHeart registrou desempenho sólido no segundo trimestre de 2025, sustentado pelo crescimento do áudio digital, que compensou a fragilidade nas vendas de spots de rádio. A receita consolidada chegou a US$ 934 milhões, alta de 0,5% em relação ao ano anterior (1,5% sem publicidade política), e o Adjusted EBITDA subiu 3,9%, para US$ 156 milhões.
O Digital Audio Group se destacou, com receita de US$ 324 milhões, alta de 13%, impulsionada pelo podcasting, cuja receita avançou 28%, chegando a US$ 134 milhões. Segundo o CEO Bob Pittman, o segmento de podcasts segue “em alta” entre consumidores e anunciantes. Já o Multiplatform Group, que inclui rádio e redes de transmissão, teve receita de US$ 545 milhões, queda de 5%, mas manteve lucro de US$ 96 milhões, com margem de 17,7%.
Como estratégia, a iHeart está focada em modernizar a forma como vende o inventário de rádio. Eles estão construindo recursos para permitir que o inventário de rádio seja comprado e vendido como publicidade digital. A empresa está alavancando sua força de vendas local, a maior dos EUA, que contribuiu com cerca de 50% da receita de podcasting no T2. A iHeart também está implementando um plano de modernização que visa uma economia líquida de $150 milhões em 2025 por meio de reestruturação, alavancagem de escala e uso de Inteligência Artificial.
MediaCo Holding: expansão em streaming e FAST
O MediaCo é um grupo de mídia focado na operação de estações de rádio e ativos de áudio, com atuação recente também em conteúdo e operações de TV por meio de aquisições estratégicas. O portfólio direto é relativamente pequeno em comparação a grandes players, tendo como núcleos principais as duas estações icônicas de Nova York, WQHT (Hot 97), voltada ao Mainstream Urban/hip-hop, e WBLS, com programação Urban Adult Contemporary. A expansão via aquisição de ativos da Estrella Media ampliou seu alcance, incorporando estações e formatos voltados ao público hispânico. Além da operação de rádio, MediaCo oferece serviços de publicidade digital, eventos e comercialização de conteúdo, consolidando-se como um player relevante no mercado urbano e hispânico.
A MediaCo Holding mostrou que a expansão em streaming e anúncios digitais pode impulsionar a receita e reduzir perdas. A empresa tem ampliado suas marcas de rádio tradicionais para o universo da Free Ad-Supported Television (FAST).
No segundo trimestre de 2025, a receita líquida total alcançou US$ 31,2 milhões, acima dos US$ 26,2 milhões registrados no mesmo período de 2024. O crescimento foi impulsionado principalmente pela receita digital, que saltou para US$ 9,4 milhões, ante US$ 3,4 milhões um ano antes, enquanto a receita de publicidade em rádio spot e TV subiu para US$ 19,1 milhões.
Embora a MediaCo tenha registrado um prejuízo líquido de US$ 9,1 milhões, o resultado representa uma melhora significativa frente à perda de US$ 49,3 milhões do segundo trimestre de 2024. A perda operacional também caiu para US$ 6,8 milhões, abaixo dos US$ 13,3 milhões do ano anterior.
Grande parte do crescimento digital da MediaCo se deve à adição dos canais FAST da Estrella Media. A empresa notou que o inventário de anúncios CTV monetizado aumentou 290% ano a ano nos primeiros cinco meses de 2025. A empresa possui estações legadas como WBLS e Hot 97, bem como o Don Cheto Radio Network, e incorporou 12 estações de rádio adicionais através de uma transação com a Estrella Media.
Beasley Media Group: o posicionamento Digital-First
O Beasley Media Group (BMG) é uma empresa multiplataforma focada na operação de rádio local, publicidade local e digital, produção de podcasts, eventos e soluções de marketing para anunciantes. O grupo opera cerca de 55 estações em diversos mercados dos EUA, com um portfólio diversificado que inclui formatos como Adult Contemporary, Top 40/CHR, Classic Rock/Classic Hits, Country, Sports/Talk esportivo, News/Talk, Urban/R&B e Old-School/Throwbacks.
O BMG está formalmente se redefinindo como uma empresa digital-first, uma mudança estratégica que a CEO Caroline Beasley considera essencial. Embora as propriedades de rádio AM/FM tradicionais continuem importantes, o foco permanece em abraçar a inovação digital e as novas tecnologias que complementam o negócio principal.
Entre as ações implementadas, o BMG agora exige componentes digitais em quase todos os pedidos de publicidade e está treinando seus vendedores para priorizarem o digital. A empresa está evoluindo para se tornar tanto uma empresa de conteúdo quanto de tecnologia, com pesquisa e desenvolvimento (P&D) focados em:
- Inteligência artificial: para conectar plataformas digitais e tradicionais.
- Melhoria da atribuição: para medir a eficácia da publicidade.
- Desenvolvimento de capacidades de venda direta: simplificando transações.
O BMG está construindo um produto que permitirá aos anunciantes comprarem inventário digital, e eventualmente over-the-air, inteiramente online, visando simplificar as transações e atrair anunciantes menores. Olhando para 2035, a CEO previu que as instalações físicas darão lugar a operações baseadas na nuvem e a IA estará incorporada em todos os aspectos do negócio.
Townsquare Media: crescimento digital e foco em mercados locais
A Townsquare Media é uma empresa de mídia e marketing digital com forte presença em comunidades fora dos 50 maiores mercados dos Estados Unidos. O grupo é composto por 342 emissoras de rádio e mais de 400 sites locais distribuídos em 74 mercados. Seu portfólio combina três frentes principais: Townsquare Ignite, voltada à publicidade digital e programática com base em dados próprios e tecnologia proprietária; Townsquare Interactive, que oferece soluções de marketing digital por assinatura para pequenas e médias empresas (como criação de sites, SEO e gestão de presença online); e o segmento de Broadcast Advertising, formado pelas emissoras de rádio locais e regionais.
No segundo trimestre de 2025, a empresa reportou receita líquida de US$ 115,4 milhões, recuo de 2,3% em relação ao mesmo período de 2024, impactada principalmente pela queda de 9,2% nas receitas de broadcast. O desempenho digital, no entanto, continuou positivo: a receita total dos segmentos digitais cresceu 2,1%, chegando a US$ 61,3 milhões, com avanço de 2,4% em publicidade digital e 1,4% em soluções de marketing por assinatura. O Adjusted EBITDA ficou em US$ 26,4 milhões, alta de 0,7% (ou 3,8% sem receita política), e o lucro líquido atingiu US$ 2 milhões, revertendo uma perda de quase US$ 49 milhões no mesmo trimestre do ano anterior.
O crescimento digital continua sendo o principal motor da Townsquare, que se define como uma “empresa de mídia local digital-first” e há mais de dois anos obtém mais da metade de sua receita a partir de vendas digitais. Agora, nos seis primeiros meses do ano, o digital respondeu por 55% da receita total e 56% do lucro operacional por segmento, operando com margem de 27%. A estratégia da companhia combina o fortalecimento do ecossistema digital local – integrando rádio, web e publicidade programática – com o pagamento contínuo de dívidas e geração de caixa sólida. O grupo mantém a meta de crescer de forma sustentável, priorizando soluções integradas de marketing para anunciantes locais e a expansão do modelo digital em mercados regionais, consolidando-se como uma das líderes em mídia e marketing digital fora dos grandes centros urbanos.
Como as emissoras estão vendendo o digital
Em geral, as propriedades digitais são incluídas como parte dos pacotes comercializados pelas equipes de vendas das rádios, onde as inserções de spots nas emissoras representam o elemento principal.
Mas a abrangência da publicidade digital oferecida varia em função do porte das emissoras envolvidas. Grandes grupos se apresentam como consultores de marketing digital para clientes locais e nacionais e tendem a oferecer soluções 360 graus que incluem o rádio linear AM/FM, streaming, redes sociais, podcasts, eventos e mídia programática em CTV. Por outro lado, as rádios independentes, com menor poder de integração, oferecem pacotes mais simples, com foco nas inserções na emissora combinadas com propriedades digitais básicas como site, redes sociais e promoções locais.
É importante destacar o novo posicionamento das rádios, que passam a oferecer “serviços digitais”. Isto fica mais evidente nas propostas comerciais dos grandes grupos, que não vendem apenas os spots ou o inventário digital próprio. Atuando como agências de marketing digital, em seus pacotes , eles vendem também mídia em plataformas externas (Google, Meta, YouTube, CTV, redes de display, DSPs). Ou seja, o anunciante fecha o contrato com o grupo de rádio, mas sua campanha aparece em múltiplos canais digitais, inclusive fora do ecossistema da emissora.
Como ilustração das oportunidades comerciais para o rádio no digital, apresentamos a seguir as principais propriedades que as emissoras estão oferecendo de forma combinada com a veiculação tradicional de spots.
Streaming online da própria emissora
O streaming simultâneo da programação ao vivo, normalmente oferecido como uma ‘extensão digital’ da transmissão tradicional e, em alguns casos, integrado ao aplicativo da emissora, é monetizado por meio de pre-rolls de áudio, banners no player e overlays.
Em emissoras menores, o modelo costuma ser mais simples, restringindo-se à inserção de spots no streaming e, ocasionalmente, acompanhados por banners no site da rádio.
Site da rádio, da rede ou grupo
Além da comercialização de banners display (rotativo ou fixo), o site oferece como oportunidade a publicação de publieditoriais (conteúdo publicitário em formato de matéria ou artigo) ou branded content em seções de notícias, músicas, promoções ou eventos locais. Isto também se aplica às newsletters ligadas à marca da rádio.
Redes sociais
As redes sociais da emissora podem ser monetizadas de diferentes formas, incluindo posts patrocinados nos perfis oficiais da estação (Facebook, Instagram, TikTok, X), lives ou reels com o comunicador ou influenciador da estação apresentando a marca e sorteios ou concursos patrocinados (muito comum em rádios musicais).
Emissoras de maior porte geralmente oferecem pacotes robustos, enquanto as menores trabalham com postagens pontuais, focadas em promoções ou sorteios locais.
Podcasts
Além dos spots produzidos pela própria rádio, podem ser comercializadas inserções dinâmicas programáticas. Outra oportunidade é a produção de branded podcasts (“powered by…”), em que a marca patrocina o conteúdo original.
Eventos e ativações
Frequentemente vendido como “integrated marketing package”, banners, logos e posts em redes sociais complementam os spots e a presença da marca em eventos da rádio (shows, festivais, ativações em feiras).
Mídia programática externa
Usando a sua expertise em marketing digital, a rádio oferece também aos anunciantes a compra de mídia digital programática via suas unidades de “digital marketing services”, tudo sob a marca da rádio ou do grupo, mas entregue em plataformas externas (Google, Meta etc.). Além de potencializar os resultados dos spots na rádio através de uma campanha coordenada, o cliente irá contar com facilidade e conveniência em apenas um ponto de contato.
Por este serviço, a rádio é remunerada com um markup percentual em cima do custo direto da plataforma programática de anúncios, como uma “margem de agência.
Propriedades digitais típicas comercializadas incluem:
- Display Ads (banners programáticos em sites parceiros)
- Vídeo online (YouTube, pre-rolls, vídeo em redes sociais)
- OTT/CTV (anúncios em TV conectada)
- Search (SEM/Google Ads) (campanhas de palavras-chave)
- Social Paid Media (Facebook, Instagram, TikTok, X, LinkedIn)
- Geotargeting / Geofencing (anúncios exibidos em dispositivos móveis quando entram em determinadas áreas como shoppings, concessionárias, eventos etc.)
- Retargeting (seguir usuários que visitaram o site do cliente)
- Native Ads / Programmatic Audio (veiculação no Spotify e outros serviços de música ou redes de áudio digital que não fazem parte do inventário da própria rádio)
Em geral, estes serviços de marketing digital “full-service” são oferecidos apenas pelos grandes grupos de rádio. Emissoras menores costumam se limitar ao impulsionamento de posts locais ou a ações realizadas em parceria com agências digitais externas.
Aplicativos móveis
Os aplicativos da emissora oferecem oportunidades de comercialização específicas como push notifications, presença em streamings exclusivos (conteúdo internet only) e patrocínios de playlists, shows online ou concursos via app.
*Fonte: ZyDigital