Imagem: Captura de tela – YouTube TV Câmara
A Câmara dos Deputados aprovou nesta terça, 4, o projeto de lei (PL 8.889/2017) que regulamenta os serviços de streaming no Brasil. O placar da votação foi de 330 votos a favor, 118 contra e 3 abstenções. O texto final (PRLE n.1), uma Subemenda Substitutiva apresentada pelo relator, deputado Doutor Luizinho (PP-RJ), foi consolidado após a rejeição de 85 das 86 emendas de plenário apresentadas.
A proposta, que agora segue para o Senado, cria a Contribuição para o Desenvolvimento da Indústria Cinematográfica Nacional (Condecine) sobre a receita bruta dos serviços de streaming e estabelece regras de cotas de conteúdo brasileiro. As principais mudanças de última hora, realizadas durante a votação em plenário, fecharam brechas que isentavam empresas controladas por capital estrangeiro do cumprimento de cotas.
Condecine
O ponto central do projeto é a instituição da Condecine-Streaming, que incidirá sobre a receita bruta anual, incluindo publicidade. As alíquotas são progressivas e variam conforme o faturamento.
Foram definidos os seguintes tetos de alíquota:
Serviço de Vídeo sob Demanda (VOD) e Televisão por Aplicação de Internet: A alíquota máxima é de 4% para empresas com faturamento anual igual ou superior a R$ 350 milhões.
Serviço de Compartilhamento de Conteúdos Audiovisuais: A alíquota máxima é de 0,8% para o mesmo nível de faturamento.
O texto aprovado permite que provedores de VoD e TV por aplicação de internet deduzam até 60% do valor da contribuição devida. Esse teto é inferior aos 70% que chegaram a ser propostos em um substitutivo anterior (de 30 de outubro).
A dedução pode ser realizada com investimentos diretos em:
- Contratação de direitos de conteúdos brasileiros independentes;
- “Produção própria” de conteúdos, desde que o provedor se qualifique como produtora brasileira. Este item tem um limite de 40% do valor total da dedução;
- Formação e capacitação de mão de obra (entre 1% e 3% do valor da dedução).
Os serviços de compartilhamento de conteúdo, que pagam a alíquota reduzida de 0,8%, não têm direito às deduções.
O texto aprovado também manteve um incentivo para provedores com mais de 50% de conteúdo brasileiro em seus catálogos. O texto prevê uma redução de 75% na alíquota.
Mudanças finais
As principais alterações feitas durante a votação em plenário nesta terça, 4, ocorreram nas regras de cotas, tanto para o VOD quanto para a TV por Assinatura (SeAC).
Um substitutivo anterior (PRLP n.6) propunha no Artigo 20 uma mudança na Lei do SeAC (Lei 12.485/2011) que dispensava “prestadoras de pequeno porte” (PPPs) e empresas com menos de 200 mil usuários do cumprimento das cotas de canais brasileiros (Cabeqs e Super Cabeqs). A regra criava uma assimetria, pois beneficiava a Sky (reclassificada como PPP pela Anatel) em detrimento da Claro e Vivo.
O texto final aprovado (PRLE n.1) resolveu a questão:
- A menção a “prestadoras de pequeno porte” foi removida da dispensa;
- Foi adicionado o § 2º ao Art. 41 da Lei do SeAC, determinando que a dispensa para empresas com menos de 200 mil assinantes “não se aplica à prestadora que seja controlada, coligada, filial ou de qualquer forma dependente de empresa estrangeira”.
Uma trava idêntica foi adicionada às cotas do próprio streaming (Art. 7º). O texto manteve a isenção da cota de 10% de catálogo para provedores de VOD com menos de 200 mil usuários. Contudo, o § 8º, incluído na versão final, determina que essa dispensa “não se aplica ao provedor que seja controlado, coligada, filial ou… dependente de empresa estrangeira”.
Outros Pontos da Regulação
O texto aprovado consolidou outros pontos que vinham sendo debatidos.
Cota de Catálogo (VOD): Os provedores de VoD deverão ter um mínimo de 10% de conteúdos brasileiros no catálogo, com um teto de 700 obras. Metade dessa cota deve ser de produtoras independentes. O prazo de transição para atingir a cota é de seis anos.
Destinação do FSA: Os recursos da nova Condecine serão destinados ao Fundo Setorial do Audiovisuial, com 30% para produtoras das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste; 20% para a região Sul e estados de Minas Gerais e Espírito Santo; e 10% para produtoras nos estados de São Paulo e Rio de Janeiro, excetuando suas capitais.
Propriedade Cruzada: Demandas do setor de TV por assinatura para revogar os Artigos 5 e 6 da Lei do SeAC, que proíbem que operadoras de telecomunicações controlem programadoras e vice-versa, não foram atendidas no texto final.
Obrigações de Carregamento (Must Carry): O Artigo 8º da lei aprovada determina que os provedores de “televisão por aplicação de internet” deverão disponibilizar os Canais de Espaço Qualificado (Cabeqs, referidos no Art. 17 da Lei do SeAC) e o Canal Comunitário (referido no Art. 32, VIII da Lei do SeAC). A demanda pela inclusão de canais universitários (ABTU) não foi contemplada neste artigo.
Smartphones: O Artigo 15º foi mantido, isentando dispositivos “de caráter portátil e destinados ao serviço móvel pessoal” (smartphones) das regras de isonomia e proeminência de conteúdo.
Responsabilidade Editorial: A definição de serviços de compartilhamento (Art. 4º, X) como aqueles em que o provedor “não é responsável pela seleção dos conteúdos disponibilizados” permaneceu no texto.
Janela de Cinema: Foi mantida a vedação de disponibilização de filmes em serviços de streaming antes de decorrido o prazo de 9 semanas de sua estreia nos cinemas.
Demandas setoriais e pontos críticos
O novo substitutivo não atendeu às principais demandas do setor de Televisão por assinatura. O texto não revogou os artigos 5º e 6º da Lei do SeAC, mantendo a proibição da propriedade cruzada entre operadoras de telecomunicações e programadoras. O setor também temia uma dupla tributação (Condecine Teles mais Condecine Streaming) em seus serviços OTT, mas o substitutivo não incluiu uma isenção. As obrigações de carregamento (must carry) de canais públicos e de comunicação pública para a “televisão por aplicação de Internet” foram mantidas.
O texto também manteve pontos que geraram debates. O Art. 4º define serviço de compartilhamento como aquele onde “o provedor não é responsável pela seleção dos conteúdos disponibilizados”, o que pode colidir com entendimentos do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre responsabilidade editorial. O Art. 15º exige tratamento isonômico de fabricantes de dispositivos, como smart TVs, mas isenta explicitamente “aqueles de caráter portátil e destinados ao serviço móvel pessoal”, excluindo os smartphones da regra.
As obrigações de carregamento (must carry) para a “televisão por aplicação de Internet”, mantidas no Artigo 8º, referem-se aos Canais de Espaço Qualificado (Cabeqs, referidos no Art. 17 da Lei do SeAC) e ao Canal Comunitário (Inciso VIII do art. 32 da Lei 12.485) . Demandas pela inclusão de canais universitários (ABTU) não foram contempladas neste artigo.
Negociação
O novo substitutivo reverteu algumas flexibilizações do texto de 30 de outubro que haviam sido criticadas pelo Ministério da Cultura e por parte do setor de produção independente. A redução do teto de dedução da Condecine (de 70% para 60%) e do prazo de transição das cotas (de 8 para 6 anos) atende parcialmente a essas críticas.
Enquanto os grandes serviços de VOD, representados pela Strima, tiveram suas condições de contribuição endurecidas, as plataformas de compartilhamento foram beneficiadas com uma alíquota máxima de 0,8%, embora sem direito a deduções. O setor de TV por assinatura (SeAC) permaneceu sem atendimento em suas principais demandas.
*Fonte: Tela Viva


